A ação da Kroton Educacional caiu quase 5% depois que uma matéria da revista VEJA disse que a empresa manipula as regras do FIES, aumentando a pressão sobre o CEO Rodrigo Galindo para explicar o futuro da Kroton num Brasil em que o programa será substancialmente reduzido.

Um executivo do setor disse que a matéria foi ‘ruim para todas as companhias [de educação], mas uma hecatombe nuclear para a Kroton’. O texto, com sete páginas, foi o assunto do fim de semana entre os gestores com exposição ao setor, e vem no momento em que o CADE analisa a compra da Estácio pela Kroton. A ação da Estácio também caiu mais de 4%.

VEJA afirmou que a Kroton pratica aumentos abusivos de preço ao longo do curso e deu exemplos em que a companhia faz cobranças extras de alunos do FIES com contratos de financiamento de 100% do valor da mensalidade. A revista mostrou alunos nesta condição recebendo boletos de cobrança a partir do segundo ano de curso.

A revista também disse que a Kroton usa a Educa Mais Brasil, empresa que pertence ao irmão de Galindo, para dar ‘descontos’ aleatórios que teriam por objetivo reduzir o preço do aluno pagante enquanto a empresa mantém o preço do aluno FIES ‘cheio’, inflando o custo para o Tesouro. 

Logo cedo, a Kroton publicou Fato Relevante para lidar com a matéria.

Nele, a Kroton não nega que faça cobranças extras, mas diz que isto está dentro das regras. A empresa publicou um trecho de seu contrato de prestação de serviços que diz: “caso o FIES financie montante inferior ao da mensalidade escolar (…) a contratada realizará a cobrança da diferença da mensalidade diretamente ao contratante”.

O problema é que, no exemplo citado pela revista, a aluna que está sendo cobrada via boleto tem financiamento de 100% da mensalidade.

Segundo alguns gestores que criticaram os argumentos da empresa, o contrato de financiamento diz claramente que a diferença deveria ser decorrente do percentual de financiamento — “eventual diferença decorrente do percentual de financiamento (…) será coberta mediante utilização de recursos próprios”.

A Kroton argumentou que uma consulta ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) no ano passado questionando a possibilidade de cobrança da diferença do aluno. O FNDE respondeu que “caso haja diferenças (…) estes valores deverão ser negociados com a instituição e o estudante”. O FNDE é o agente operador do FIES, responsável pelos trâmites burocráticos do programa, e alguns gestores questionam se a autarquia tem autoridade legal para dar a resposta à empresa.

“A Kroton fica usando argumentos jurídicos em vez de defender o que seria razoável,” disse um gestor.

O fato relevante também ignorou as bolsas concedidas de forma aleatória pelo Educa Mais, afirmando apenas que os descontos não são “regulares e de caráter coletivo”, o que tornaria os alunos do FIES elegíveis aos mesmos descontos. 

Na apresentação feita ao mercado no final do ano passado para justificar as diferenças de preço, a empresa não informou o tamanho dos descontos advindos da Educa Mais argumentando que esta era uma informação comercial estratégica. 

Em relação aos aumentos abusivos de preço ao longo do curso, a empresa disse que os reajustes são realizados de acordo com a Lei da Mensalidade Escolar, por turma e aplicados de forma linear. A companhia diz divulgar os custos e informações que usam nas planilhas que são disponibilizadas para auditorias do MEC. 

Para os críticos da Kroton, o argumento não é convincente. Ele afirmam que a lei permite que a empresa aumente a mensalidade apenas para repassar custos de pessoal e custeio. 

“Se um dos grandes méritos da companhia ao longo do tempo foi conseguir implementar cortes de custos e professores, como a planilha consegue justificar aumentos de preço da ordem de 50% (do 1o para o 2o semestre), seguido por um aumento de 20% no semestre seguinte, em um total de 75% ao final do primeiro ano de curso, como no exemplo da reportagem?” pergunta um gestor.

A matéria de VEJA mostra que as críticas à forma como a Kroton opera o FIES estão aumentando, e a queda na ação hoje sugere que a empresa está lutando para oferecer explicações aceitáveis pelo mercado.