Desde que Philippe Reichstul tentou rebatizar a Petrobras de Petrobrax nos anos 90, nenhuma troca de identidade corporativa foi tão questionada quanto a da BM&F Bovespa — que, caso você esteja morando em outro planeta, passou a se chamar B3 (de “Brasil, Bolsa, Balcão”) após a fusão com a Cetip.

“Quem foi a mente prodígio do marketing que teve a brilhante ideia de jogar no lixo o nome BM&F Bovespa e todo seu valor e trocar por B3?”, questionou um crítico no Twitter. “Se fosse a Odebrecht eu entenderia, mas a Bovespa?”

Outro fuzilou:  “Anos e anos com o nome e agora se inspiraram no 3G? Imagina a NYSE mudando o nome? Francamente.”

Nem bem o novo nome tinha sido anunciado, já circulava nas redes sociais e grupos de Whatsapp uma montagem com os personagens da série infantil de TV “Bananas de Pijama”, que atendem por B1 e B2, ao lado do logo da B3. 

E, na imprensa financeira, sempre que a B3 é mencionada, as notícias agora vêm com o incômodo aposto “ex-BM&F Bovespa”.  O Índice Bovespa manterá seu nome de batismo, mas o ticker da ação, BVMF3, vai mudar mais à frente, o que também foi motivo para chacota.  Um analista da Empiricus lançou uma enquete sobre o novo código: deveria ser BBBB3, BBBL3 ou BOBA3? (É claro que, pelo bem da piada, venceu a terceira opção).

Transições de marcas sempre causam algum estranhamento, e é possível que os céticos de hoje sejam vencidos pelo cansaço (ou pelo uso repetido da marca). Mas a ideia de largar para trás um nome tradicional e consagrado realmente levanta indagações:  o que a Bovespa tem a ganhar com a mudança?  Algum investidor internacional estará mais inclinado a operar no Brasil por causa disso? Isto contribui para a liquidez do mercado, ou, melhor ainda, para baixar os custos das corretoras, que estão fechando as portas uma atrás da outra?

Aliás, para muitos corretores, a mudança da marca é uma tentativa da Bolsa de repaginar sua imagem monopolista, que cresceu com a fusão com a Cetip.

“A Bovespa vem acumulando caixa enquanto as corretoras, que alimentam boa parte do seu lucro, minguam e amargam prejuízos ou fecham as portas,” diz um corretor. “Além de jogar a história na lata do lixo, esse novo nome é uma falta de tato.”

Fundada em 1935, a Bolsa Oficial de Valores de São Paulo passou a ser conhecida como Bovespa em 1967. Na fusão com a Bolsa de Mercadorias e de Futuros (BM&F) em 2008, a Bovespa entendeu por bem apenas agregar o nome da nova parceira ao seu.  Já na união com a Cetip, não seguiu o mesmo caminho. 

O objetivo do novo nome é passar a mensagem de que as competências complementares da Bovespa e da Cetip, juntas, criam valor – o mesmo discurso adotado pela Bolsa para convencer investidores e o CADE das vantagens da fusão, que deve gerar R$ 100 milhões de sinergias anuais.

A nova marca foi criada pelo escritório GAD, o mesmo que repaginou a identidade visual da Cetip após o IPO em 2009.

O novo logotipo traz um B entre colchetes e elevado ao cubo — o slogan é, “toda a potência do mercado”.

Apesar de parecer simples, a nova marca teve que vir acompanhada de um manual de uso. Uma lista de instruções enviadas à imprensa diz que B3 tem que ser grafado “com B maiúsculo e símbolo que representa o número 3. Nunca por extenso”. E “sempre em negrito”.

“A marca pode ser lida de duas formas: bê três ou bê três, Brasil, Bolsa, Balcão,” diz o manual. “Mas a grafia da marca é sempre B3.”

Os gastos com marketing não foram divulgados mas devem ser significativos, especialmente para duas empresas que não costumavam anunciar. A campanha da nova marca inclui inserções na TV paga, rádio, meios digitais e outdoors em São Paulo, Rio e Brasília. Os anúncios na imprensa especializada vão dos veículos nacionais a estrangeiros como The New York Times, Financial Times, The Economist e The Wall Street Journal. 

Procuradas, nem a BM&F Bovespa nem o escritório quiseram falar.

Para um especialista em branding que hoje comanda o marketing de uma instituição financeira, apesar de toda paixão e confusão despertada, a utilização de uma marca simples no lugar de um nome tradicional vai ao encontro do que se está fazendo internacionalmente.

“A Procter & Gamble hoje é P&G, a Gessy-Lever virou Unilever. Uma das marcas mais conceituadas do mundo tem o nome mais trivial possível: Apple”, afirma. 

(Mas ‘Bovespa’ não era trivial?) 

Por fim, ele aposta num velho mantra do marketing:  “Na transição, as pessoas quase sempre falam mal, mas o importante é ser assunto. É aquela história: falem mal, mas falem de mim.”